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Mães que se reciclam, por Urda Alice Klueger

 O dia das Mães mais uma vez se aproxima e pedimos para nossa querida Urda Alice Klueger que nos mandasse para a sua coluna uma crônica sobre este dia tão significativo dedicado para alguém tão significativo que são nossas mães. Urda carinhosamente nos enviou esta sua crônica dedicada à sua querida mãe no ano 2000.  Ela nos fala de sua mãe e de suas particularidades e costumes e de como principalmente soube se adequar a novos tempos ao mesmo tempo que não perdeu seu encanto, simplicidade e dedicação . Ah! e como seu amor pela Geografia a acompanhou durante toda sua  importante vida! 


Mães que se reciclam


(Para Ivani Butzke e para

Minervina Klueger, minha mãe)

- Escrito no ano 2000


Se tivesse tido a oportunidade, minha mãe

teria sido uma geógrafa, tal o seu gosto por saber tudo a

respeito dessa ciência. Mas ela só teve acesso à escolinha

rural de onde se criou, e só pode estudar até a terceira série

primária.


Ela teve uma vida difícil: criou-se comendo

do que seu pai produzia nas roças, e ganhando o vestido

novo no Natal, o único do ano.


Eu a conheci quando ela passava dos 30 anos,


e fazia tudo com suas mãos : ajudava a matar porco,

mourejava numa horta e num jardim, criava, desde o choco,

as galinhas dos almoços de domingo, fazia tachos de sabão

com sebo e breu, costurava as roupas das suas três meninas,

bordava as nossas fronhas e engomava as nossas anáguas.

O tempo passou, o mundo mudou, e minha

mãe se reciclou com a mesma velocidade do mundo.

Filha com a mãe se adaptando a tecnologia . foto:Pexels


Beirando os 80 anos, ela manda recados via Internet para os

netos que moram lá longe, no Continente Africano; ela tudo

sabe sobre o que os políticos fazem em Brasília e sobre o que

os artistas fazem nos bastidores da televisão. Continua

mourejando numa horta e num jardim; produz a metade do

que come, e “sem agrotóxicos”, diz com orgulho. Ela nasceu

para ser uma geógrafa, mas não deu. Só que não abandona a

sua inclinação natural. Minha mãe, acredito, é a única mãe

de quase 80 anos, do Brasil, que ganha Atlas novos, no Dia

das Mães, quando a Geografia muda, e num instante

interpreta o seu Atlas e descobre os novos países e as suas

particularidades. Se ela tivesse tido a oportunidade da

escola!


Quantas mães se reciclam com a velocidade


da minha?


Blumenau, 09 de Janeiro de 2000.


Urda Alice Klueger


Escritora, historiadora e doutora em Geografia